Se a Câmara apoiar financeiramente o hospital as consultas de urgências poderão ser gratuitas para os idosos do concelho
No momento em que o financiamento do Hospital da Misericórdia da Mealhada está na ordem do dia, João Santos, da RCPfm, e Nuno Castela Canilho, do Jornal da Mealhada, falaram com João Peres, provedor da Santa Casa da Misericórdia da Mealhada. O provedor esclareceu o que falhou no plano inicial da instituição, e nas alternativas que agora se colocam. Entregar aos credores, arrendar a privados ou gerir o hospital com o apoio financeiro da Câmara Municipal, eram hipóteses que João Peres colocava em cima da mesa aquando da entrevista. O tempo passou e hoje sabe-se que a Câmara Municipal da Mealhada recusou o pedido de apoio para o funcionamento do hospital.
Recentemente, leu-se na comunicação social que a instituição Santa Casa da Misericórdia está falida. É verdade?
A Santa Casa da Misericórdia da Mealhada, como todos sabem, tem um património imobiliário que dá para pagar aquilo que deve, dez ou vinte vezes. Tem ainda um património social incalculável. Ao longo da sua história, a Santa Casa da Misericórdia, graças aos bons gestores e homens de bem que por lá têm passado, tem enriquecido, material e socialmente, o património da instituição.
Afirmo aqui que é verdade ter enviado uma carta ao banco com quem trabalhamos e ao senhor presidente da Câmara Municipal da Mealhada. Disse, efectivamente, que a nossa tesouraria está em ruptura, o que poderá pôr em causa a insolvência da valência. É com a tesouraria que se pagam as batatas, o bacalhau e o leite para as crianças. No entanto, de maneira alguma, deixaremos de fazer isso por causa do hospital. Não vamos pôr em risco qualquer outra valência.
Foram então enviadas cartas...
Uma carta da qual não existe cópia, nem eu próprio tenho cópia. A mesa administrativa não teve conhecimento dessa carta, foi feita por mim e é da minha responsabilidade. Não sei como é que isso foi parar à comunicação social, muito menos com que intenção.
Ficou surpreendido com o facto de o assunto ter chegado à comunicação social?
Sim. Não sei com que intenção é que isso foi divulgado. O tempo dirá se as vozes que o fizeram não o estarão a fazer para se desculparem de alguma tomada de posição ou para outra coisa qualquer... O tempo o dirá. Pôr em causa a falência de uma Misericórdia e, principalmente, da Misericórdia da Mealhada, traz água no bico. Lembro ainda que, desde a origem da Misericórdia da Mealhada, foram entregues valores patrimoniais, cuja gestão a história consagra como exemplos de honestidade e boa gestão. Relembro que a Misericórdia da Mealhada nasceu porque alguém, há cem anos, contruiu um hospital para servir esta terra e entendeu que só uma Misericórdia seria capaz de o gerir e tomar conta dele.
A Santa Casa da Misericórdia da Mealhada nasceu para receber o hospital.
A Santa Casa da Misericórdia não existia na Mealhada. A Misericórdia da Mealhada foi fundada para receber um hospital, que um particular fez, custeou e entregou. O hospital da Mealhada nasceu primeiro que a Misericórdia da Mealhada. A Misericórdia da Mealhada nasceu para gerir esse hospital e, durante setenta anos, até ao 25 de Abril, a saúde deste concelho foi da responsabilidade da Santa Casa. Era a sua única actividade. Depois do 25 de Abril, fomos espoliados do nosso hospital. Nessa altura, a Misericórdia ficou praticamente sem actividade social. Mais tarde, surgiu a possibilidade de a Misericórdia prestar apoio à terceira idade, através do Ministério da Segurança Social, coisa que faz há vinte e poucos anos.
Acabou por reconquistar terreno perdido?
O resultado está à vista. Começámos, na nossa sede, com doze camas para idosos e nove funcionários. Hoje, assistimos mais de quatrocentas pessoas e temos mais de duzentos funcionários e colaboradores. Ou seja, pôr em causa a continuidade da instituição Santa Casa da Misericórdia da Mealhada, o seu património ou o trabalho dos gestores, que por cá têm passado e que cá estão, acho que traz muita água no bico. Não sei o que querem dizer com isso, não sei para que é que isso serve.
Para além do apoio à terceira idade presta também apoio à infância.
Mais tarde, entrámos para a área da infância, que estava abandonada. A casa Bissaya Barreto, a Casa da Criança, foi-nos entregue. Hoje está à vista o que conseguimos fazer com aquele património que comprámos ao Governo Civil. Assistimos mais de duzentas crianças. Na infância somos, a nível nacional, das entidades mais prestigiadas e que melhor condições têm.
Em síntese, desmente que haja o risco de falência da Santa Casa da Misericórdia da Mealhada?
Só por lapso, não lhe chamo outra coisa, poderá passar pela cabeça de alguém que a Misericórdia da Mealhada alguma vez possa estar em falência.
Descreveu a história do hospital até à nacionalização. Como é que volta a haver, dentro das intenções da mesa administrativa, esta vontade de retomar a obra mãe desta casa?
Como disse há pouco, com o 25 de Abril, foi-nos tomado o hospital, que era um hospital novo, tinha sido inaugurado em 1972. Muito mais tarde, não recordo agora o ano, o hospital foi-nos devolvido. Foi reposta justiça e devolveram o hospital ao dono. Mas devolveram-no num estado lastimável. O Estado nunca lá tinha gasto um litro de tinta, nunca lá pregou um prego. O Centro de Saúde estava instalado nas instalações do hospital e, através de um negócio entre a Câmara Municipal e o Ministério da Saúde, foi-nos pedido que cedêssemos o terreno onde está construído o Centro de Saúde e retomámos a posse do hospital. Na altura, deram-nos cinquenta mil contos e foi-nos imposta uma condição, pelo Ministério da Saúde, e que está escrita em Diário da República: teríamos de colocar o hospital, novamente, ao serviço da população. A partir daí, nós não pensámos noutra coisa que não fosse recuperar o hospital e entrarmos, novamente, na área da saúde.
E começaram por fazer um projecto de reconstrução do hospital...
Mudaram-se os governos, não se mudaram as vontades, e surgiu a hipótese da Comunidade Europeia financiar a recuperação de hospitais. Avançámos com um projecto, que foi alterado duas vezes. Já tínhamos um primeiro acordo para prestação de cuidados continuados, com dezasseis camas, e fizemos novos acordos com o anterior Governo, quer nessa área, quer em outras áreas da saúde. Também nessa altura foram-nos impostas algumas condições para a celebração desses acordos, nomeadamente, a exigência de serviços de fisioterapia e de meios auxiliares de diagnóstico.
Isso levou a que tivessem de alterar o projecto?
Exactamente. Nós alterámos o projecto, indo ao encontro da vontade do Ministério da Saúde, da altura. Inicialmente, não estavam previstos, obviamente, os serviços de meios de diagnóstico nem a fisioterapia.
Os acordos acabaram por ser assinados.
Esses acordos foram firmados com o Ministério da Saúde. Chegou a vir à Mealhada o ministro e avançámos com a obra do hospital. Pensámos, também, que, tendo a Mealhada um serviço de atendimento permanente, o chamado SAP - que não era uma urgência - era a nossa obrigação, em colaboração com as entidades de saúde, fazer no novo hospital um serviço de urgências.
Urgências que acabaram por substituir o SAP.
Mas as urgências, que agora temos, não nasceram para substituir o SAP: O SAP é uma coisa, as urgências são outra. O SAP não satisfazia, completamente, as necessidades da população. Então, nós fizemos umas urgências para complementar o serviço do SAP, nunca para o substituir.
O ministro que assinou o acordo foi, entretanto, substituído.
Nessa época, que é recente, surgiu outro problema: tomou posse um novo governo. Mudaram-se as vontades e mudou-se a política da saúde. Nós fomos apanhados já no fim da linha. Já não tínhamos hipótese de recuar. A obra estava realizada, o investimento estava feito, os acordos anulados, o que é que iríamos fazer?! Não tínhamos nem temos condições financeiras para suportar o investimento e suportar a exploração do hospital.
São coisas distintas?
Exactamente. Há custos de investimento, que nós tinhamos feito, e que eram suportáveis para nós, e há custos de exploração, para o arranque e estabilização nos três primeiros anos. Um hospital tem custos loucos de exploração. Pensámos em aguentar os custos de investimento e colocava-se a questão: mantínhamos o hospital fechado ou iríamos abri-lo? Com o hospital fechado, íamos aguentando a situação. Estava vazio, não gastava água nem luz, não tinha pessoal, estava parado.
Em termos financeiros qual foi o impacto da quebra desses acordos?
Basta dizer que com o dinheiro que o Estado nos pagaria pelas vinte camas dos cuidados continuados, estivessem elas ocupadas ou não, nós receberíamos os cinquenta mil euros que precisamos para as despesas do hospital. São contas muito fáceis de fazer. Esse acordo previa também que o número de camas, logo o financiamento, fosse aumentando com o tempo. Ou seja esta situação de reptura de tesouraria nunca se colocaria se os acordos tivessem sido honrados.
O que vos fez optar por abrir o Hospital?
Surgiu, depois, o enecrramento do SAP, facto com que ninguém contava. Nós somos uma empresa. Estamos aqui para servir a população e para promover o seu bem-estar. A população estava sem serviços de saúde e nós tínhamos a capacidade para resolver o problema. Decidimos então abrir o hospital. Surgiram algumas promessas de que os acordos iriam ser retomados. Foi-nos dito que estava a ser pensada uma nova política na área da saúde. E também, temos de o dizer, fomos alvo de alguma pressão política, dado que não ficava muito bem termos um hospital novo, inaugurado, e ele não abrir. Resolvemos então abrir o hospital.
E o Governo está a cumprir?
O Governo está a cumprir algumas coisas que disse. Já foram retomados alguns acordos, nomeadamente, o SIGIC, os da lista de espera. Já fomos contactados para retomar o acordo dos cuidados continuados. Ainda não temos cá ninguém, mas é ponto assente que os vamos ter. E estão previstos outros acordos para mais tarde. Só que, entretanto, nós abrimos em Agosto e já estamos em Março. E, todos os meses, é preciso que aqui entrem, pelo menos, cinquenta mil euros.
Para as despesas de exploração ou também para as de investimento?
Para as duas. Acresce ainda o facto de, em Março, termos aberto as urgências, que, como toda a gente sabe, nunca darão lucro. É certo que também não estamos aqui para ter lucro, mas urgências serão sempre um serviço deficitário. Mas é um serviço social. As urgências dão um prejuízo mensal de vinte e cinco mil euros.
Como é que têm aguentado esse prejuízo?
Com a boa vontade da pessoa que implementou o serviço de urgências, que me disse para eu não me preocupar, pois falaria com os médicos e com os enfermeiros. E os vencimentos do mês de Março só serão pagos em Maio. Com dois meses de folga vamos criando alguma receita. Foi com estes pressupostos que as urgências abriram. E é isso que está acontecer.
Mas já disse que as urgências darão sempre prejuízo.
Terá de ser um prejuízo coberto pelas outras áreas de serviço como os meios diagnósticos, o internamento, o SIGIC. Mas como atrás disse, a nossa tesouraria, de Agosto até agora, esgotou. Tínhamos, então, três soluções para não pôr em risco a tal insolvência da valência, nunca da instituição, porque não vale a pena estar a reclacar isto: tem um património incalculável. E podem perguntar por que não vendemos património, se temos tanto?!
Por que está a maior parte desse património ao serviço da população?
Claro. Mas também não seria inédito que a própria Câmara Municipal comprasse esse património. Outras Câmaras têm-no feito. Temos um valor de património incalculável, grande, muito grande. Bastaria vender o edifício do hospital à Câmara Municipal, ou a uma entidade privada, para pagarmos a toda a gente e ainda ficarmos com outro tanto, na tesouraria. Se vendêssemos o lar de idosos pagávamos a toda a gente, ou se vendêssemos a Casa da Criança ou o mercado, dito municipal, mas que tem dono, a Misericórdia. Seria fácil vender a privados mas perderíamos o proveito.
Estava a dizer que se deparou com três cenários para resolver a situação. Que cenários seriam esses?
O primeiro, o mais simples, seria fechar e entregar o hospital à banca, com quem temos a dívida. Faríamos como o Egas Moniz, com a corda ao pescoço, diríamos que não temos hipóteses de pagar, e entregaríamos uma coisa que vale muito mais do que a quantia que nos emprestaram.
Quantos postos de trabalho tem, neste momento, o hospital?
Muitos.
Essa solução significaria o despedimento dessas pessoas?
Sim e, para além disso, deixaríamos de criar mais cinquenta postos de trabalho que se prevêem para quando o hospital funcionar em pleno. E a perda da população. Passaria, assim, efectiva e imeditamente, para o sector privado lucrativo.
E com que outras soluções se depararam?
Nós temos condições, temos património, temos o hospital, temos equipamento, o que é que nos falta?! É dinheiro. Então, vamos procurar um parceiro privado que meta aqui dinheiro. Essa seria a segunda opção.
E a terceira?
A terceira hipótese era ir ter com a Câmara e fazer com ela uma parceria para financiamento do funcionamento do hospital. As câmaras municipais têm tanta ou mais obrigação do que nós em zelar pelo bem-estar das populações.
Então foi essa a hipótese escolhida.
Optámos por essa terceira solução. Fomos ter com a Câmara Municipal, que já tinha comparticipado com quinhentos mil euros a construção do hospital. Esta será, no nosso entender, a melhor solução. Não será difícil para a Câmara encarar isto como um apoio em termos económicos. Seria sempre um apoio provisório, até isto entrar no ritmo, durante três anos, na pior das hipóteses. Foi essa a proposta que fizemos à Câmara. Apresentámos várias alternativas e, independentemente destas, acreditamos que a Câmara nos poderá propor outras sugestões. O que nós não queremos é que isto deixe de ser controlado pleo concelho. Pode ser a Misericórdia ou a Câmara Municipal ou outra entidade qualquer a gerir o hospital, desde que seja com o fim de servir a população. Foi esta proposta que fizemos à Câmara, é a proposta que está em cima da mesa, é essa a proposta sobre a qual a Câmara tem de decidir. Porque nós não temos condições para continuar com o hospital aberto, para além deste mês de Março.
No modelo que apresentou à Câmara, a Santa Casa da Misericórdia manteria a propriedade do imóvel? Estaríamos a falar de uma empresa municipal? Como é que uma câmara municipal pode apoiar, directamente, um projecto destes?
A mesa da Misericórdia está na disposição de aceitar qualquer tipo de apoio que a Câmara queira dar. O que nos interessa, e o que deve interessar à população, é que o Hospital da Misericórdia da Mealhada não mude de mãos, não deixe de ser gerido por pessoas do nosso concelho. Entendemos que, desde que seja uma entidade com fins sociais, obviamente da Mealhada, é indiferente quem explora o hospital.
Pode não ser a Misericórdia a explorar o hospital?
Pode não ser a Misericórdia a explorar o Hospital, porque também puseram em dúvida a capacidade de gestão da Santa Casa. O espelho da Misericórdia vê-se pelos seus antecessores, pelo seu passado. Eles não estão cá para responder, mas deixaram a história. Palavras para quê?! Está à vista. Se duvidam da capacidade de gestão da Santa Casa da Misericórdia no presente, estou cá eu para responder. Podem duvidar da minha capacidade, mas também posso mostrar o meu currículo como gestor. Há mais de vinte anos que estou na Misericórdia, aprendi muito com os meus antecessores. Trabalhei com dois belíssimos provedores, homens de bem, o dr. Santos e dr. Pato Macedo. As pessoas que me acompanham na mesa da Misericórdia são pessoas em fim de carreira profissional e têm todo um currículo profissional. Em termos de gestão, acho que não há qualquer dúvida. Não nos preocupa que seja outra entidade a gerir o hospital. Formem uma empresa municipal, formem uma empresa mista, formem um empresa qualquer, a Câmara que sugira aquilo que entender.
Está a dizer-nos que a decisão da Cãmara poderá não estar limitada às hipóteses apresentadas pela Misericórdia?
Nós só pretendemos que o controlo do hospital não deixe de ser mealhadense, que não fuja do controlo do munícipio. E acrescento que, caso a Câmara apoie financeiramente o hospital, poderemos conseguir, entre outras regalias, que as consultas de urgência sejam gratuitas para todos os idosos do concelho e que, para os contribuintes do concelho, se implemente um modelo semelhante ao do público, apenas com o pagamento de uma taxa moderadora. Isto porque estamos a falar de um possivel subsídio que provém de dinheiros de impostos dos contribuinetes do nosso concelho. Estamos a falar de umahipótese, mas estamos dispostos a ouvir todas as sugestões por parte da Câmara. Logicamente que as propostas que nós fizemos à Câmara não são as únicas. Reforço aqui que estamos abertos e disponíveis para ouvir qualquer outra proposta que a Câmara nos queira fazer e que traga benefícios sociais para o concelho. Acrescento, também, que estamos à espera de uma Unidade Móvel de Saúde, que vai estar ao dispor da população do concelho caso a Câmara venha a apoiar este projecto.
Qual é que acha que vai ser a posição da Câmara, em relação a este projecto?
Uma coisa é qual a posição que vai tomar, outra coisa é a posição que eu gostava que tomasse. Já disse qual a posição que gostava que tomasse. A que vai tomar, não sei. Não me meto nisso, é um problema da Câmara Municipal. Posso dizer que fui contactado por um jornalista, que me fez a mesma pergunta, e respondi que não acho nada, que, para já, não é um problema meu. O jornalista deu-me a entender que já sabia a resposta da Câmara. Eu não sei. Comentou que o assunto já foi abordado e até me disse que sabia que nós precisávamos de uma resposta até ao dia 15 de Abril, porque temos uma assembleia de irmãos. É tudo verdade, só não sei como é que um jornalista tem acesso a estas informações todas. Eu confirmei e respodi-lhe que a Câmara deve decidir o que acha melhor para a população.
O senhor presidente da Câmara é um homem que se preocupa com o bem-estar das populações do concelho, tem dado provas disso. Além disso, recordemos que quando foi o encerramento do SAP, disse, e bem, que não estava muito preocupado com este encerramento porque, no seu entender, aquilo não servia a população, era insuficiente e queria mais. Portanto, aí o tem. Melhor que isto não há. O senhor presidente da Câmara tem sido sensível às situações sociais e tem-se preocupado com a população. Após uma afirmação destas, estamos esperançados que a Câmara Municipal reconsidere muito bem.
Mas será sempre um imprevisto orçamental para a Câmara...
Mas isso é como em tudo na vida. Primeiro está a saúde. E embora a Câmara tenha previsto outras prioridades, tenha os seus planos, surgiu este problema. Não sei como é que eles vão pensar, mas a saúde não tem preço. Penso que vai resolver isto pela positiva.
E se a Câmara disser que não apoia?
A Misericórdia gostava que a Câmara apoiasse este projecto. Se a Câmara tomar outra posição para nós não é dramático. Mas socialmente é muito mau para o concelho. Para a Santa Casa da Misericórdia da Mealhada, se a Câmara recusar o aopio, mesmo do ponto de vista económico, não é dramático. Temos uma proposta de um grupo privado que, a este nível, nos é bastante favorável.
Mas isso acarreta consequências prejudiciais para a população?
Obviamente que sim. Os privados vêm aqui com uma proposta para ganhar dinheiro. Não vêm para dar consultas especiais, nem urgências a quinze euros, nem raio-x a nove euros. Vêm cá para ganhar dinheiro. É um investimento como outro qualquer. "Vocês têm aquilo que nós andavámos à procura: o equipamento e as instalações. E nós temos aquilo que vocês precisam: os doentes", disseram-nos os responsáveis desse grupo privado numa reunião que tivemos.
Mas pode dizer-nos que grupo privado é esse?
Não é nenhum segredo, mas acho que não é oportuno dizê-lo já publicamente. É um grupo bastante forte, bastante credível, talvez o maior grupo de saúde do país.
O que oferece o grupo privado?
É simples. O tal grupo privado oferece tudo o que a Misericórdia quiser: Pode simplesmente comprar o edifício do hospital. Pode essa entidade assumir todo o passivo que a Misericórdia tem, ou seja, toda a dívida que temos passaria para essa entidade e ainda nos pagaria uma renda mensal. Outra solução seria atribuírem-nos uma percentagem sob a facturação do hospital. Melhor do que isto, como já disse, não há. A Misericórdia estaria, portanto, financeira e ecocnomicamente, como um peixinho na água.
Seria, efectivamente, um bom negócio.
Nós estamos aqui para criar bem-estar às populações, o nosso investimento é social, não é financeiro. Não estamos aqui, portanto, para ganhar dinheiro. O acordo com os privados resolveria todos os problemas finaceiros e ainda ganharíamos com isso. Mas o maior problema fica por resolver: o problema social. Fica a população da Mealhada outra vez ao abandono, sujeita à especulação do privado. Que fique bem claro, eles vêm para aqui para ganhar dinheiro. Há também o problema moral. A Câmara Municipal deu quinhentos mil euros para a construção do hospital para um grupo privado explorar?! O que dizer às centenas de pessoas que, como eu, deram o seu contributo quando nós anunciámos que íamos construir um hospital "social"?!
Se as coisas correrem mal, como se vai dirigir a essas pessoas?
O que é que eu posso dizer?! Se nós não temos hipótese nenhuma de governar esta casa, pelas contingências que se nos apresentaram pelo caminho, o que é que podemos fazer? Temos de nos entregar. Não há outra solução. Só com uma parceria salvaguardamos tudo isto. Não há outra maneira de resolver o problema. Eu próprio me sinto ludibriado porque também contribuí financeiramnete. Como mealhadense sabia que o hospital ia ser recuperado e ia ser posto ao serviço da população. As pessoas têm de compreender que pelo caminho nos cortaram as pernas. A alteração do Governo veio mudar tudo.
A bola está então, neste momento, do lado da Câmara?
Eu não quero de maneira alguma dizer que a bola está do lado da Câmara. Quando partimos para este projecto, também não consultámos a Câmara para saber se isto era um projecto viável ou não. Agora, atendendo às circunstâncias, com este historial todo, é a Câmara que efectivamente pode resolver este problema. E poderá ser a alternativa para continuarmos a usufruir desta estrutura no concelho. Temos este problema, ajudem-nos a resolvê-lo porque, sem a vossa ajuda, não temos hipóteses.
(in Jornal da Mealhada, 4 de Abril de 2007)
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