Universia

segunda-feira, junho 11, 2007


À CONVERSA COM... RUI MARQUEIRO

Se Cabral for candidato estarei ao lado dele. Se, hipoteticamente, eu fosse candidato, sei que ele estaria a meu lado.

Rui Marqueiro foi presidente da Câmara Municipal da Mealhada durante uma década. Nas últimas eleições autárquicas, em Outubro de 2005, voltou a ser eleito, agora como presidente da mesa da Assembleia Municipal. Em Março de 2006 regressou aos cargos partidários, foi eleito presidente da comissão politica concelhia do Partido Socialista. Já anunciou que se recandidatará no próximo ano. Ao Jornal da Mealhada e ao Rádio Clube da Pampilhosa, no programa À conversa com..., falou da gestão municipal, das concordâncias e das discordâncias no seio do seu partido e da crise de 2001 com a cisão do Movimento Odete Isabel.

Qual é o balanço que faz do seu mandato na liderança no Partido Socialista da Mealhada?
É um balanço positivo. Temos procurado incrementar medidas que levem os militantes a aproximarem-se entre si e dos dirirgentes, e a procurar dinamizar actividades político-partidárias. O PS tem tido uma acção a meu ver de moderação, de expectativa face aos fenómenos político-sociais e, sempre que entendemos, fazemos chegar aos média as nossas posições. Sinto o Partido Socialista mais vivo, com mais capacidade de responder aos desafios, produzindo mais pessoas capazes de assegurar a direcção dos órgãos autárquicos. No fundo, o Partido Socialista a nível concelhio, e essa é nossa segunda grande preocupação, vem preparando quadros de qualidade mesmo para a representação distrital e, quem sabe, até mais.

Que acções têm realizado?
Para além das reuniões estatuárias da comissão política, temos procurado fazer reuniões nas freguesias. Já as fizemos na Antes, na Pampilhosa, com uma vertente de Convenção Autárquica, e em Casal Comba. No dia 26 de Maio, no Luso, continuámos os trabalhos da Convenção Autárquica. Temos reunido, discutido, temos aplainado algumas diferenças e, porventura, temos cavado outras.

A convenção autárquica realizou-se na altura em que completou o primeiro aniversário da sua eleição para a comissão política. Na altura disse-nos que o PS devia ter uma missão de formação dos seus quadros.
Eu penso que o PS tem essa missão mas também tem de promover a discussão, a troca de informações, a participação na imprensa nacional do partido, como no jornal Acção Socialista. Por outro lado, também alargámos o número de militantes do concelho a integrar os órgãos distritais do partido. Essa é a verdadeira formação política. É evidente que devemos ter conhecimentos teóricos mas a praxis política, essa é a grande conselheira, é equivalente à nossa vida, à nossa experiência. Portanto, o facto de discutirmos, de confrontarmos argumentos, é importante. Um dia em que num partido político não houver confronto, isso significa que o partido morreu! Os partidos políticos são tanto mais vivos quanto maior discussão há no seu seio, quanto maior é a possibilidade de confronto de ideias. Não me canso de dizer que, em determinados momentos, tive inveja da vivacidade do PSD, por exemplo, onde o combate de ideias, por vezes, assumiu proporções, talvez até exageradas.

Concorda que o concelho da Mealhada é, sociologicamente, socialista?
Se nós olharmos para todo o trajecto das eleições desde as primeiras eleições para a assembleia constituinte até hoje, verifica-se uma constância de vitórias do PS, tendo pelo meio algumas vitórias do Partido Social Democrata.

Nunca muito expressivas...
Algumas bastante expressivas. O PSD ganhou o PS, por duas vezes, a Câmara Municipal da Mealhada. Ganhou algumas juntas de fregeusia de maneira esmagadora. Como, por exemplo, a última vitória na freguesia da Mealhada. O PSD, com as maiorias absolutas de Cavaco Silva, ganhou algumas vezes eleições legislativas.

No concelho a esquerda apresenta-se normalmente com dois partidos ao passo que a direita só tem um...
Fazendo a tradicional divisão direita-esquerda temos quatro partidos tradicionais. No concelho, à esquerda do PS temos o PCP, nas suas coligações. E depois temos o Partido Social Democrata e o CDS, que aparece esporadicamente em eleições locais. Mas a verdade é que o CDS tem votos e um dia em que conseguir um candidato conhecido no concelho, em que consiga organizar listas, veremos que o partido alcançará umas centenas de votos. Eu fico a rezar para que isso aconteça. Não me levem a mal que diga isto aqui.

É um apelo?
Não é nenhum apelo para que os centristas se organizem, mas agora, com o Paulo Portas, vai haver um novo fluxo, suponho eu, um fluxo político no interior do CDS. Veremos se o CDS é capaz de se afirmar, ou não, num quadro municipal. Eu digo sinceramente, oxalá que sim. Porque neste momento o PSD nem precisa de fazer coligação. Normalmente, o que acontece é que se o CDS aparece com alguém que não se conhece, os votos dessa área política acabam por se precipitar na urna a favor do PSD.

Acha que na Assembleia Municipal fazia falta uma nova força política?
Eu acho que se tem juntado, à direita, aquilo que não se devia juntar. Para mim é absolutamente evidente que ser do CDS é muito diferente de ser do PSD. Enquanto que o CDS defende o conservadorismo, não há dúvida nenhuma que o PSD começa nos liberais e passa até aos social-democratas. Penso que estes ainda estão em maioria. Nós podemos verificar que o discurso de um CDS, do seu líder ou dos seus homens mais conhecidos, é um discurso muito centrado no indivíduo, na propriedade privada, no liberalismo económico. Enquanto que, no PSD, não é assim. Vemos gente que defende o papel do Estado, que acredita que o Estado deve controlar a procura, que deve intervir quando ela está débil, que deve abrandar quando ela se demonstra pujante, que defende políticas sociais. Claro que a direita tomou algumas destas bandeiras por necessidade de se aproximar do centro político. Mas a prática mostra que não é assim. Se olharmos para a acção política de alguns dos ministros do CDS, vemos que a vertente liberal do mercado e do capital finaceiro esteve sempre mais presente do que nos ministros PSD. Há diferenças e essas diferenças também deviam ter expressão no concelho.

Por que não têm?
Por incapacidade dos líderes locais, penso eu. Mas à esquerda também há um outro fenómeno político que, nas eleições legislativas, tem expressão no concelho. Estou a falar do Bloco de Esquerda (BE). Quando o BE aparece nas legislativas tem umas centenas de votos. São pessoas que, provavelmente, nas eleições autárquicas votam útil, porque não têm representação autêntica no espectro político concelhio. É sempre positivo que o eleitorado se sinta representado. Eu também já votei útil, mas sinto-me muito mais à vontade quando tenho posicionamento no espectro político.

Essa maior diversidade promoveria o debate?
Se fosse possível tornaria a Assembleia Municipal mais viva, mais dinâmica, mais participativa e alargaria o espectro de representação.

A Assembleia Municipal, nos últimos anos, perdeu o ritmo. Porquê?
Isso tem muito a ver com o papel que se quer da Assembleia Municipal. A Assembleia olha para o seu quadro legal e procura respeitá-lo, escrupulosamente, reunindo em Fevereiro, em Abril, em Junho, em Setembro e, depois, em Novembro ou Dezembro. Se necessário, e a pedido da Câmara, reúne extraordinariamente. O debate político na assembleia, não tem sido muito vivo, muito aceso, e nem sequer parece existir aquilo que deve ser a fiscalização da actividade camarária. A fiscalização da actividade camarária não é um fiscal que chega e pede uns papeizinhos e faz ali uma auditoria. O papel da assembleia relativamente ao executivo municipal é de avaliação genérica e não tem mais do que transmitir o pulsar político do concelho. A Assembleia tem tido um papel de apoio da parte do PS, e um papel de crítica mais ou menos sistemático por parte do PSD, com a CDU relativamente apagada, neste quadro. A actividade municipal é do conhecimento, sobretudo, dos membros da Câmara. E se os membros da Câmara não o quiserem incentivar esse espírito de combate político na assembleia desaparece.

Porquê?
Porque também se limitam ao mínimo. Se o presidente da Câmara e se os membros da Câmara quiserem suscitar o debate é relativamente fácil. Muitas vezes quando tinha que tomar uma decisão, tinha dúvidas. Vou dar um exemplo: quando a Junta Autónoma de Estradas propôs à Câmara o projecto daquelas rotundas todas, eu tive imensas dúvidas que aquilo pudesse ser bom. E suscitei a discussão, peguei naquilo e levei para a Assembleia Municipal, sujeito a todas as críticas e mais algumas, sujeito ao debate político e houve um debate intensíssimo. Recordo-me perfeitamente dessa assembleia com Jacinto Silva e com alguns membros do PSD. Trocámos ali opiniões, onde eu próprio, confesso, não tinha certezas nenhumas. E, se calhar, só começámos a ter certezas quando a Câmara deu luz verde para se fazer essa obra. Hoje não estou arrependido, mas podia estar se aquilo não tivesse funcionado.

A passividade da Assembleia Municipal poderá também ser responsabilidade da Câmara?
Isso tem tudo a ver com uma praxis política.

Por aquilo que tem observado, qual é que tem sido a prestação do PS na Câmara da Mealhada?
Eu acho que prestação do PS tem sido positiva. Eu só tenho relativo conhecimento dos dossiês, do plano de actividades, do orçamento, os grandes documentos que têm que ir à Assembelia Municipal. Da visão que tenho deles, eu acho que a Câmara deixou de inflacionar tanto os seus documentos, tornou-os mais aderentes à realidade. O orçamento deve ser um guia que não deve ser demasiado optimista. Acho que a Câmara, nesse aspecto, tem andado bem. Quanto ao conjunto das opções camarárias concordo, numa percentagem muito elevada, com o que tem sido apresentado à Assembleia Municipal.

Mas também tido discordâncias...
Quando se tratou deste problema todo à volta do Hospital da Misericórdia, eu disse que a Câmara Municipal poderia ter estudado a possibilidade de fazer do Hospital a âncora de uma eventual política pública municipal de saúde. Eu teria feito isso. Eu tenho a convicção de que aquilo era uma oportunidade. Como oportunidade, teria que ser estudada. Ver os custos financeiros, analisar a gestão do hospital, e a possibilidade de fazer uma parceria com a Misericórdia e uma negociação com o Ministério.

Daquilo que conhece do dossiê, essa poderia ser uma opção?
Poderia ser uma opção, sim, se fosse comportável em termos financeiros e se fosse melhor para os habitantes do concelho. Isso é o princípio de qualquer serviço que se quer aproximar do cidadão. E que os custos sejam comportáveis e a relação custo-benefício seja favorável. Quando disse que poderia, acho que a Câmara não fez esse esforço, entendeu que não devia fazer. Tem toda a legitimidade para isso. Eu disse isso e repeti-o na Assembleia Municipal, onde se falou desse problema, mas isso não leva a que eu não seja solidário com os membros da Câmara. Eu tenho uma posição que é a de cidadão empenhado presidente da Assembleia Municipal. Eu entendo que a Câmara tem legitimidade para fazer o que fez e eu não discuto.

Carlos Cabral é acusado de ser demasiado positivista, demasiado legalista. Houve da parte de Carlos Cabral, neste caso, uma atitude de mera observância dos preceitos legais?
Os preceitos legais não impediam a Câmara de apoiar o hospital. A questão é de opção política. Quem acompanha o plano e orçamento sabe que não havia dotação para isso, ou seja, no cálculo político da Câmara Municipal isso não se incluía nos seus objectivos a curto e a médio prazo. Só o futuro poderá dizer se foi uma boa ou má opção a decisão que a Câmara tomou. No futuro, a médio prazo, vamos ver qual é a evolução da política de saúde, vamos ver como é que a Misericórdia vai resolver o problema que tem. Eu acho que a Saúde vai ter desenvolvimentos muito grandes, porque se converteu num grande problema para o Estado. O Serviço Nacional de Saúde enfrenta, de facto, um enorme desafio e acho que talvez uma das respostas fosse chamar as comunidades locais às suas responsabilidades.

A oposição acusa os dirigentes socialistas de falta de ambição. Sendo presidente da comissão política do PS o que tem a dizer acerca disto?


Eu penso que a oposição na Câmara e o próprio poder têm exagerado no seu confronto. Têm esticado de mais a corda e têm entrado em questões mais do foro pessoal do que propriamente político. No entanto, a qualidade da oposição melhorou. Tem mais garra, é mais actuante. Penso que a maioria tem dado provas de unidade, de estabilidade. Quanto à ambição, ela é desmedida, podemos ter sempre aquilo que desejamos e ainda querermos sempre mais. A Câmara, pelas contas, tem tido uma postura de moderação. Julgo eu procurando preparar o background financeiro e de recursos humanos. Se o presidente e os vereadores, que estão dentro dos dossiês, entendem que é necessário ter uma situação mais estável do ponto de vista financeiro, poupando recursos durante os três últimos anos para depois conseguir fundos comunitários, então talvez seja uma boa lógica. Desde que o montante dos fundos comunitários, a quantidade de projectos que a Câmara consegue ver financiada, o justifique. Vamos aguardar, atentos, e não vamos criticar.


Acha que os projectos que a Câmara tem definidos são os mais necessários?


O Plano Director Municipal que terminou em 1994, definiu o turismo e os serviços como pólos fundamentais de desnvolvimento do concelho da Mealhada. Apostou nos serviços e fez também uma aposta em alguma industrialização. É indiscutível que o entroncamento ferroviário mais importante é a Pampilhosa. Cheguei a fazer vários contactos com o presidente da administração da REFER, na altura CP, Crisóstomo Teixeira, sobre a ideia de criar uma plataforma logística. E essa ideia foi-nos sendo validada. O que é uma plataforma logística? É algo de que se servem as empresas para o armazenamento de mercadorias para o acabamento final na carga contentorizada. Isto é fundamental. Por outro lado, é indubitável que o concelho da Mealhada tem uma propensão muito grande para o turismo. Nós queríamos acompanhar, desenvolver e incrementar infra-estuturas que pudessem servir o turismo. Assim se fez: a recuperação do lago do Luso, o parque de campismo, o centro de estágios e os pavilhões. Eu sempre achei que pavilhão do Luso se destinaria, especialmente, à competição e a verdade é que o tempo veio a dar-me razão. Hoje, não há hoteleiro nenhum, no concelho, que possa dizer que estas infra-estruturas não influenciaram já o seu negócio.


No Luso há também o termalismo...


O termalismo clássico tem muitas dificuldades, mas continua a chamar uns milhares pessoas. Isto se as termas forem bem geridas e tiverem qualidade. A ele devemos associar o turismo de lazer, de bem-estar, e ainda a perspectiva que surgiu há relativamente pouco tempo que é a de aproveitar a possibilidade de ter ali um complexo turístico termal associado a outras valências ligadas à saúde e ao bem-estar. É isso que a Universidade de Coimbra está a desenvolver com o protocolo que executivo municipal assinou. Nada disto é para amanhã. Mas eu penso que a câmara interpretou bem o Plano Director Municipal que tinha as condições de desenvolvimento económico que o concelho permitia e procura potenciar essas vertentes do desenvolvimento.


E tem aplicado bem o dinheiro?


Tem aplicado o dinheiro que a actividade tem posto à sua disposição. Com uma ressalva, que disse e mantenho: de facto, nos últimos dois anos, a Câmara não tem esgotado todo o plafond das suas receitas. Tem procurado poupar. Eu não teria feito isso, não teria sido conservador nessa matéria. Teria sido um pouco mais ousado. Mas é preciso esclarecer que, de certo modo, a Assembleia Municipal tem ajudado a Câmara Municipal nessa medida. Uma vez que, ao permitir à Câmara que fixasse uma valorização da zona industrial, ajudou bastante. Fez com que esses excedentes pudessem ser possíveis. A Câmara Municipal consegue na zona industrial da Pedrulha um boa fonte de financiamento da sua actividade. Coisa que não aconteceu com a zona industrial de Viadores. Aí os terrenos foram comprados e vendidos praticamente ao preço de custo.


Existem dissidências dentro do Partido Socialista?


Não. Há opiniões diversas: por exemplo, agora há dias, li e ouvi uma entrevista da senhora vice-presidente, Filomena Pinheiro, em que ela abordava a problemática da fiscalidade municipal e dizia que estariam a estudar a descida do IMI. Houve quem viesse logo dizer: "Pois, são anos de eleições". Vamos ser correctos com este problema. A Câmara Municipal, seguindo os conselhos da Associação Nacional de Municípios, fixou as taxas no mais alto nível possível. Verificou, depois, que a receita começou a descolar em valores inferiores aos impostos antigos. Os políticos pagam os custos de terem os impostos mais altos e a Câmara pagou-os conscienetemente. Estamos agora numa altura em que parece evidente que os impostos antigos estão a ser ultrapassados pela receita dos impostos novos e, na última reunião da Assembleia Municipal, onde se abordou esta problemática, o Partido Socialista, pela boca de Júlio Penetra, disse que, a continuar a manter-se este ritmo, o PS se comprometia a estudar uma redução das taxas para, evidentemente, dar resposta ao sentimento dos munícipes que deveriam pagar um pouco menos de IMI. Esse é o assunto que vai ser discutido este ano, quando a Câmara discutir a fixação das taxas.


Mas em relação a fricções do PS, elas são visíveis, nomeadamente da parte de antigos vereadores.


Está a falar de Ferraz da Silva?


Por exemplo.


Ferraz da Silva foi escolhido por mim para a equipa de vereação. Eu tenho muita consideração por Ferraz da Silva. É um homem que escreve bem, trabalhou o melhor que pôde e soube na Câmara. Eu valorizei sempre o trabalho dele no município. Portanto, não vejo nenhuma razão para Ferraz da Silva ter as posições que ultimamente assume. Eu não quero ser crítico ao ponto de dizer que ele faz isto por lhe ter sido negada a possibilidade de estar na lista do PS. Eu faço justiça de não pensar isso dele. Mas tenho visto algumas críticas de Ferraz da Silva com erros objectivos que o colocam de certa maneira mal. Ferraz da Silva, neste momento, autocritica-se porque se refere a situações passadas nas quais ele assumiu responsabilidades. Parece um exercício de auto-flagelação.


Os militantes que foram expulsos do partido depois da dissidência de 2001 já foram readmitidos no partido?


Não. A respeito da situação deles já houve um princípio de discussão no quadro da comissão política concelhia e foi considerado que alguns desses antigos militantes se têm aproximado do partido. Nós temos visto isso com gosto. Naquele combate, em 2001, houve vários agravos pessoais, alguns deles contra mim próprio e contra Carlos Cabral, que chegou a ser ameaçado de morte, através de cartas. Estou a dizer isto pela primeira vez. Se calhar nem ele sabe disso, mas a verdade é que um dia quando me dirigi à Câmara Municipal, as funcionárias do secretariado estavam apavoradas porque tinham aberto as cartas e estavam lá ameaças de morte. Houve terrorismo político, nessa altura. A exaltação chegou a toda a gente e vamos procurar esquecer isso. Penso que está aberta a porta para alguns desses militantes regressarem. Vamos com algumas cautelas. Esses militantes, se quiserem, poderão, dentro de algum tempo, aparecer porque continuam socialistas de coração.


Estamos a dois anos e meio das autárquicas. O presidente da comissão política será o candidato natural a cabeça-de-lista nas eleições para a Câmara?


Não. O presidente da comissão política concelhia do PS já, por várias vezes, não foi candidato à Câmara. No caso presente, eu acho que é ser deselegante para o actual presidente estarmos a discutir isso. Entendo, porém, que devo voltar a candidatar-me a presidente da concelhia porque está a ser um exercício interessante. Este trabalho que tenho feito tem-me aproximado mais às bases do PS. Tem sido gratificante.


E dessa aproximação poderá surgir a sua candidatura à Câmara?


Carlos Cabral abandonou a comissão política, por motivos que só ele conhece. O número dois era o Jorge Carvalho, que assumiu com espírito de sacrifício a sua presidência e que, ao terminar o seu mandato, disse que achava que eu poderia, face ao meu passado, à minha experiência política, candidatar-me. Eu não vi inconveniente nenhum e avancei. Para quem possa pensar que eu pretendo com isto regressar à política activa local, importa dizer que eu não precisava de ser presidente da comissão política para o fazer. Se eu entendesse que devia apresentar uma candidatura, eu fá-lo-ia.


É hipótese ser novamente candidato à Câmara?


Em política não se deve dizer nunca. Acho que o PS, neste momento, está muito bem. Tem um conjunto grande de possíveis candidatos: tem o actual presidente, a senhora vice-presidente, tem António Jorge Franco, que é vereador, é um jovem e que podia ser bom presidente, tem José Calhoa, que é um homem já com experiência autárquica, antigo presidente da Junta de Freguesia, mas tem também a engenheira Arminda Martins, que está na Assembleia Municipal, Júlio Penetra, que tem capacidade, intelecto e capacidade de liderança, José Miguel Felgueiras, que já é director de departamento na Câmara, onde trabalha, com conhecimentos aprofundados em matéria autárquica, tem muitos militantes na JS. Portanto, o PS tem uma quantidade de quadros que poderão assegurar bons executivos no futuro.


Acha que, em 2009, pode dar-se o caso de termos um novo conflito entre marqueiristas e cabralistas?


Não. Carlos Cabral contou sempre com o meu apoio nas eleições. Candidatou-se em 2001 e teve o meu apoio e de que maneira! Eu fui candidato à Assembleia Municipal. Candidatou-se em 2005 e eu voltei a estar ao lado dele. Fiz campanha nas ruas, fiz tudo o que podia para o PS ser o vencedor. Um cenário de conflito não vai voltar a acontecer. Primeiro porque se ele for candidato, estarei ao lado dele. Se, hipoteticamente, eu fosse candidato, sei que ele estaria ao meu lado.


Mas, na escala de preferências, releva a eventual vontade do actual presidente em continuar?


Eu não sei em que posição vai chegar o actual executivo a seis meses das eleições. Imagine que fazemos uma sondagem e o resultado é negativo. Carlos Cabral foi candidato em 2001 porque tinha as melhores sondagens. Fez-se uma sondagem, foi ponderada a candidatura dele e a de Odete Isabel. Se calhar também não se sabe isso. Foi feita uma sondagem, com cerca de mil e quinhentas chamadas telefónicas. Carlos Cabral ganhou essa sondagem, com vantagem, sobre Odete Isabel. E vou dizer, pela primeira vez em público, que, se Odete Isabel fosse candidata pelo PS, também teria ganhado as eleições. Em 2005, Carlos Cabral voltou a ser candidato e teve uma boa sondagem, apesar de não se perspectivar, de maneira nenhuma, a derrota na freguesia da Mealhada.


A poucos meses vai decidir-se então qual dos dois se vai candidatar?


Com certeza. Porque há uma coisa que é evidente: se a comissão política escolher Carlos Cabral, não tenha dúvidas, só há duas opções para os socialistas: ou apoiam ou saem. A nossa obrigação é estar junto ao militante que a maioria dos outros militantes do PS vai escolher. Se houver dúvidas quanto isso, poderemos repetir a velha técnica que usámos em 2001. Fez-se um referendo e Cabral ganhou sem dúvida nenhuma. Ninguém fez batotas. Foi fiscalizado pelos órgãos nacionais do partido. A camarada Odete Isabel que me desculpe, mas ele ganhou e não é, como já ouvi dizer, nenhum usurpador!